Canto de pássaros, árvores grandiosas e frutíferas
adicionados a diversas esculturas seriam
a definição perfeita para um parque paulista, mas falo aqui do Cemitério da
Consolação, o primeiro cemitério da cidade de São Paulo. Localizado em uma das
principais avenidas que interligam a zona oeste à zona central paulista, a Rua da Consolação, o
cemitério revela-se como uma “república das artes”, definida assim pelo monitor
Popó, Francivaldo Gomes, o responsável pela monitoria da necrópole.
Inicio o passeio e personagens históricos da
cidade de São Paulo, do estado paulista e também do Brasil são relembrados por
Popó, que aponta os túmulos. Nesse parque ou cemitério, deixo a critério do
leitor escolher, arte, história e natureza se misturam de forma tênue. Enquanto
observamos a arte, percebemos um nome histórico e de repente somos
surpreendidos por um pé de mexerica. Graviolas, jabuticabas, laranjas e
mexericas são só alguns dos sabores encontrados pelo cemitério. E estão
carregadas. Não é incomum ver os funcionários saboreando as frutas diretamente
do pé. Ali, no meio de São Paulo.
Em uma das ruas, a beleza de um parque
Apesar de estarmos em meio a esculturas de fé, o cemitério é um lugar de todos. Túmulos de personalidades das mais diversas religiões se misturam com políticos renomados ou mesmo nomes com menos popularidade que não esquecem de seus antepassados com obras simbólicas da dor do adeus.
Nomes de políticos como Campos Sales, Anhaia
Melo, Washington Luís, família Matarazzo e família Jafet são primorosamente
representados por esculturas belíssimas. Libero Badaró, por exemplo, foi um dos
precurssores da criação do cemitério ao ar livre. Seu túmulo ainda que modesto relembra
com delicadeza o jornalista defensor do liberalismo na imprensa brasileira.
Outro túmulo em destaque é o da Domitila de
Castro do Canto e Melo, a Marquesa de Santos. A mais famosa amante de Dom
PedroI também ajudou na construção do cemitério, doando em 1857 dois contos de
réis para a construção da capela original. É impossível não perceber o túmulo
de Domitila, bem próximo a capela, apesar de pequeno se destaca por ser inteiramente
branco, feito em mármore de carrara.
Um dos grande nomes da literatura brasileira,
Monteiro Lobato possui um túmulo singelo porém imponente. Quase sem adorno demonstra
com o melhor exemplo sua própria reputação: a simplicidade. O arquiteto Ramos
de Azevedo também marca grande área do cemitério, não somente seu túmulo agrega
beleza ao local, mas a atual capela, o
portão de entrada e o prédio da administração do cemitério são obras do célebre
arquiteto. Só para relembrar, o Teatro Municipal, a Pinacoteca do Estado e o
Mercado Municipal, em São Paulo, são alguns exemplos de obras assinadas pelo
“Escritório Técnico Ramos de Azevedo”.
Como parte da história brasileira, a escravidão
não passa despercebida no Consolação, como é carinhosamente conhecido. O
abolicionista e escravo Luiz Gonzaga Pinto da Gama está representado com a
escultura de um manto sobre a cruz, símbolo escolhido por sua empresa para
representar a sua perda.
Grandes nomes do movimento modernista também
estão sepultados na necrópole: Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Tarsila do
Amaral, incentivadores do modernismo no Brasil, são alguns exemplos. Não é por
acaso que escultores brasileiros ganham
destaque, com exemplos ali no próprio cemitério, na década de 1920. A Semana de
Arte Moderna de São Paulo, em 1922, foi
o pontapé inicial para artistas brasileiros se apresentarem ao mundo. No Consolação
escultores como Francisco Leopoldo e Silva, que aliás trouxe o primeiro nu para
o cemitério, ou mesmo o artista Celso Antônio datam suas obras em 1926 e 1927
respectivamente, confirmando o início do novo conceito de arte brasileira.
Ainda no quesito artístico, é difícil escolher
uma escultura somente. Mas posso afirmar que duas são imperdíveis. Uma delas é
a “Euterpe”, a deusa da música, que ornamenta o túmulo de Luigi Chiafarelli,
músico e professor de música ítalo-brasileira. A escultura consegue transmitir
de forma poética a tristeza da perda. O tom verde de oxidação do bronze realça
peculiarmente a obra.
Euterpe
Antes de terminar o tour, ou melhor, o
bate-papo com o Popó, o educador do cemitério que continua o processo educativo
iniciado por seu mestre Délio Freire dos Santos, me emociono. O cearense adotou
São Paulo como lar e faz a diferença em benefício à cidade que chama de sua. Me
disse com todas as letras “Ame a cidade de São Paulo”, como se não bastasse repetiu
para que eu não mais pudesse esquecer. Era tarde, Popó, a mensagem já estava
gravada em mim. Sairia feliz e nunca mais olharia a cidade com os mesmos olhos.
Cemitério da Consolação. Rua da Consolação, 1660 - São Paulo - SP. Para agendar visitas guiadas, ligue para (11) 3396-3822.
Cemitério da Consolação. Rua da Consolação, 1660 - São Paulo - SP. Para agendar visitas guiadas, ligue para (11) 3396-3822.
Outros cemitérios pelo mundo que valem a visita!
Cemitério Nacional de Arlington – Arlington,
Virginia – EUA.
Apesar de localizado no estado da Virgínia, o
cemitério possui fácil acesso de Washington, DC. Um dos mais tradicionais
cemitérios militares dos Estados Unidos, o Arlington guarda nomes de guerreiros
perdidos em batalhas. Há ainda uma área dedicada aos desconhecidos. Não deixe
de visitar a flama que nunca apaga do presidente John F. Kennedy, um dos
presidentes mais relembrados na história americana.
Cemitério da Recoleta – Buenos Aires, Argentina.
O cemitério da Recoleta localiza-se no bairro
homônimo em área nobre de Buenos Aires. Quando adentram a necrópole, os
visitantes buscam conhecer o túmulo de Eva Perón ou Evita Perón, ex-primeira
dama argentina e esposa de Juan Perón. Além de Evita estão sepultados na
Recoleta muitos ex-presidentes da Argentina e nomes importantes para o país.
Cemitério Père Lachaise – Paris, França.
Considerado o cemitério com o maior número de
visitantes do mundo, o Père Lachaise em Paris destaca-se pelos túmulos de
grandes celebridades como exemplo: Jim Morrison, ex-vocalista da banda The
Doors; Allan Kardec, precurssor do espiritismo no mundo; e a cantora francesa Edith
Piaf.